Recentemente, aquele painel foi substituído por outro mais radical: "Não pise o interior do recinto megalítico".
Mas os granitos são assim tão frágeis?
Caso de Estudo nº 2
Na perspectiva do pré-historiador, no entanto, é na arte rupestre que se encontram os melhores testemunhos, para avaliarmos a suposta fragilidade dos granitos. Presentes um pouco por todo o mundo, resistem, sem sinais evidentes de desgaste, há vários milhares de anos, aos rigores dos elementos...
Exemplos,escolhidos entre centenas, de gravuras pré-históricas, nos granitos. Só no Alentejo Central, conhecem-se atualmente largas dezenas de exemplares, sobretudo representados por painéis de "covinhas", gravadas maioritariamente nas superfícies horizontais de afloramentos graníticos; na verdade, o mesmo tipo de afloramento de onde foram extraídos os blocos usados na construção da maioria dos monumentos megalíticos eborenses... na verdade, muitos monumentos megalíticos ostentam também este tipo de gravuras.
Por muitos ensaios que possam ser feitos em laboratório, as covinhas e a arte megalítica, em geral, são, do ponto de vista arqueológico, o melhor ponto de partida para avaliarmos a taxa de erosão nestes granitos, na escala de tempo que nos interessa…e, evidentemente, essa taxa anda muito próxima de zero.
Não é difícil identificar, nos granitos regionais, áreas de rocha menos compacta, a par de material mais resistente. Ora, os afloramentos são, por natureza, o resultado de erosão diferencial e foi este o material que, conscientemente ou não, foi utilizado quer para a construção dos monumentos megalíticos, quer como suporte para as gravuras.
De resto, sem querer meter a foice em seara alheia, parece-me fácil assumir que boa parte dos fatores que costumam ser apontados para a alteração dos granitos em monumentos históricos, não se verificam no Alentejo Central, no caso concreto dos megálitos (Almeida 2007: 2012).
É o caso da poluição atmosférica ou da salinidade (ambiental ou presente nas argamassas ou ainda resultante do uso dos edifícios), como é também o caso dos gelos (apontados como um dos principais fatores das alterações verificadas nos menires bretões) ou ainda da própria pluviosidade que, comparativamente, no Alentejo é relativamente baixa; é óbvio que a dimensão "megalítica" dos blocos é um fator favorável, comparando com o uso dos granitos, em monumentos históricos, com blocos de dimensões muito mais modestas. A diferença, em termos de alteração da rocha, na relação entre a superfície exposta aos agentes externos (físicos, químicos, biológicos) e o volume dos blocos, é fundamental."
Na verdade, as próprias formas arredondadas dos blocos (sobretudo nos menires), resultantes da "disjunção esferoidal", comparando, por exemplo, com a ortogonalidade dos silhares romanos, implicam uma maior resistência aos agentes erosivos externos; de facto, se olharmos para os silhares das muralhas romanas de Évora, verificamos que a erosão se manifesta sobretudo no arredondamento dos cantos e arestas
Para avaliarmos a alteração dos granitos, utilizados nos monumentos megalíticos, nos últimos 5000 anos, basta observar os topos dos esteios (geralmente 3) onde se apoiam os chapéus. Apesar de muitos deles serem relativamente "aguçados", é evidente, só pela observação da estrutura, que não houve alteração significativa na massa desses esteios. Num caso ou noutro, porém, são observáveis fissuras que se relacionam naturalmente com a pressão do chapéu (sobretudo em contexto de abalos sísmicos) sobre o topo dos esteios portantes.
Note-se que estes blocos foram:
1. Retirados do respetivo contexto geológico (certamente os afloramentos e caos de blocos superficiais)
2. Manipulados (extração, transporte e ereção),
3. Cobertos com tampas pesadas,
4. Recobertos pela mamoa,
5. Expostos pela erosão,
6. Sujeitos aos efeitos dos sismos...
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